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Autogoverno popular e federalismo: 150 anos da Comuna de Paris

Há 150 anos a capital francesa, Paris, era tomada pela insurreição de trabalhadores e trabalhadoras que deu início a experiência revolucionária de autogoverno popular e federalismo da Comuna de Paris, se espalhando também para cidades como Lion, Marselha e Tolouse.

Vive la Commune! Foi o grito que estourou em 18 de março de 1871 frente a capitulação da burguesia republicana e a invasão estrangeira no contexto da Guerra Franco-Prussiana. A guarda nacional composta por trabalhadores com o apoio do movimento socialista, uma importante presença da Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT) e influências das ideias federalistas de Pierre Joseph Proudhon, toma o poder sobre a cidade de Paris. O primeiro decreto da Comuna foi a supressão do exército e sua substituição pelo povo em armas.

Na descrição de Marx, “a Comuna era composta de conselheiros municipais eleitos por sufrágio universal nos diversos distritos da cidade. Eram responsáveis e substituíveis a qualquer momento. A Comuna devia ser, não um órgão parlamentar, mas uma corporação de trabalho, executiva e legislativa ao mesmo tempo. Em vez de continuar sendo um instrumento do governo central, a polícia foi imediatamente despojada de suas atribuições políticas e convertida num instrumento da Comuna, responsável perante ela e demissível a qualquer momento. O mesmo foi feito em relação aos funcionários dos demais ramos da administração. A partir dos membros da Comuna, todos que desempenhavam cargos públicos deviam receber salários de operários. [….] Como é lógico, a Comuna de Paris havia de servir de modelo a todos os grandes centros industriais da França. Uma vez estabelecido em Paris e nos centros secundários o regime comunal, o antigo governo centralizado teria que ceder lugar também nas províncias ao autogoverno dos produtores. No breve esboço de organização nacional que a Comuna não teve tempo de desenvolver, diz-se claramente que a Comuna devia ser a forma política inclusive das menores aldeias do país e que nos distritos rurais o exército permanente devia ser substituído por uma milícia popular, com um tempo de serviço extraordinariamente curto. As comunas rurais de cada distrito administrariam seus assuntos coletivos por meio de uma assembleia de delegados na capital do distrito correspondente a essas assembleias, por sua vez, enviariam deputados à delegação nacional em Paris […].” (Karl Marx, em “A Guerra Civil na França”).

A Comuna de Paris terá fim após 72 dias com o massacre dos comunards na Semana Sangrenta que termina em 28 de maio de 1871. A experiência revolucionária de autogestão dos trabalhadores passa a ser um dos pilares para a construção dos modelos políticos e debates entre as correntes socialistas até os dias atuais. Louise Michel, anarquista francesa e símbolo da Comuna, que teve a fundamental participação das organizações de mulheres do povo, proclamava: “Não podem matar as ideias a tiros de canhão nem tão pouco algemá-las. O fim apressa-se tanto mais quanto o verdadeiro ideal surge, belo e poderoso, superior a todas as ficções que o precederam.”

Mikhail Bakunin, um dos fundadores do sindicalismo revolucionário e dirigente da ala federalista da AIT, que teve decisiva participação na Comuna de Lyon e outros levantes populares na França entre 1870 e 1871, em seu texto “A Comuna de Paris e a noção de Estado”, de junho de 1871, afirmava que:

“O socialismo revolucionário acaba de tentar uma primeira manifestação brilhante e prática na Comuna de Paris. Sou um partidário da Comuna de Paris, que, por ter sido esmagada, sufocada em sangue pelos verdugos da reação monárquica e clerical, não por isso deixou de se fazer mais vivaz, mais poderosa na imaginação e no coração do proletariado da Europa; sou seu partidário em grande parte porque foi uma negação audaz, bem pronunciada, do Estado.

É um fato histórico imenso que essa negação do Estado tenha se manifestado justamente na França, que foi até agora o país por excelência da centralização política, e que seja precisamente Paris, a cabeça e o criador histórico dessa grande civilização francesa, que tenha tomado essa iniciativa.

Paris, que abdica de sua coroa e proclama com entusiasmo sua própria decadência para dar a liberdade e a vida à França, à Europa, ao mundo inteiro; Paris, que afirma de novo sua potência histórica de iniciativa ao mostrar a todos os povos escravos (e quais são as massas populares que não são escravas?) o único caminho de emancipação e de salvação; Paris, que dá um golpe mortal nas tradições políticas do radicalismo burguês e uma base real ao socialismo revolucionário; Paris, que merece de novo as maldições de toda gente reacionária da França e da Europa; Paris, que se envolve em suas ruínas para desmentir solenemente a reação triunfante; que salva com seu desastre a honra e o porvir da França e demonstra à humanidade consolada que se a vida, a inteligência e a força moral retiraram-se das classes superiores, conservaram-se enérgicas e cheias de porvir no proletariado; Paris, que inaugura a nova era, aquela da emancipação definitiva e completa das massas populares e de sua solidariedade de agora em diante completamente real, através e apesar das fronteiras dos Estados; Paris, que mata o patriotismo e funda sobre suas ruínas a religião da humanidade; Paris, que se proclama humanitária e ateia e substitui as ficções divinas pelas grandes realidades da vida social e a fé na ciência; as mentiras e as iniquidades da moral religiosa, política e jurídica pelos princípios da liberdade, da justiça, da igualdade e da fraternidade, estes fundamentos eternos de toda moral humana; Paris heroica, racional e crente, que confirma sua fé enérgica nos destinos da humanidade por sua queda gloriosa, por sua morte, e que a transmite muito mais enérgica e viva às gerações vindouras; Paris, inundada no sangue de seus filhos mais generosos, é a humanidade crucificada pela reação internacional coligada da Europa, sob a inspiração imediata de todas as igrejas cristãs e do grande sacerdote da iniquidade, o Papa; mas a próxima revolução internacional e solidária dos povos será a ressurreição de Paris.”

A Universidade Popular Mikhail Bakunin realizará o curso online “150 anos da Comuna: Autonomia Popular e Revolução Social” que ocorrerá entre os dias 17 e 28 de maio de 2021, com inscrições abertas que podem ser feita através do site do Arquivo Bakunin.

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